sábado, 16 de fevereiro de 2013

Hipóteses para a sucessão papal


Com a multiplicação de nacionalidades representadas no conclave que elege os papas, o sucessor de Bento XVI poderá vir de qualquer lugar. E poderá ter qualquer foco em seu pontificado. O nome desse Papa e o foco que ele terá depende fundamentalmente das questões priorizadas pelos cardeais eleitores do conclave. Além, obviamente, do direcionamento espiritual que qualquer líder religioso deve (ou deveria) buscar.

Se os cardeais eleitores quiserem que o futuro Papa priorize questões mais tradicionais da Igreja e mesmo o diálogo com outras agremiações cristãs e com as outras crenças abraâmicas (judaísmo e islamismo), é provável que elejam um Papa europeu, e que ele seja possivelmente um Papa italiano, dada a prevalência de cardeais italianos no conclave (são cerca de 22 cardeais italianos num universo de 119).

Se os cardeais eleitores (mesmo os europeus, a esmagadora maioria) admitirem que a igreja europeia precisa de uma sacudida, talvez um Papa de fora da Europa seja a melhor pedida. Um profeta não é bem vindo em sua terra. Um Papa missionário poderá ajudar o catolicismo europeu, que anda sofrendo com uma série de questões. Alguns organismos da Igreja Católica tem uma história de eurocentrismo: aquela doutrina aplicada em várias áreas humanas segundo a qual os europeus devem ensinar ao mundo, sem que os outros lhes ensinem. Um Papa de fora da Europa reverteria o eurocentrismo: a Europa também tem o que aprender com outras partes do mundo.

Na hipótese de um Papa de fora da Europa, o mais provável é que ele venha da América Latina ou da África, de onde vem alguns cardeais eleitores influentes. A igreja latinoamericana e a africana são as que mais cresceram nos últimos séculos. Não sem problemas. Um Papa latinoamericano ou um africano poderá atacar os problemas do catolicismo nessas regiões. Há a hipótese remota de surgir um Papa americano, pois o segundo maior grupo de cardeais eleitores é de americanos (o maior é o de italianos) e a Igreja americana tem uma pujança enorme no país e tem influência no Vaticano, a despeito dos bispos e padres americanos que violaram os mais diversos votos e promessas feitas por ocasião de suas ordenações e atraíram a reprovação até dos fiéis católicos. Contra os papáveis americanos pesa a influência do próprio país de origem, influência já considerada enorme em qualquer campo a nível mundial e que poderia melindrar adversários históricos do papado, como o governo da China. Outra questão: um Papa americano representaria mais os interesses da Igreja ou os interesses da nação americana? É o mesmo tipo de dúvida que ameaçou a eleição do presidente John Kennedy, até hoje o único católico a chegar à Presidência dos Estados Unidos, país pródigo em eleger protestantes para o cargo. Por fim, apontam a possibilidade remota de surgir um Papa filipino ou canadense.

Um Papa latinoamericano seria uma cartada tão ou mais ousada que a da eleição do Papa João Paulo II. O Papa polonês foi o primeiro Papa de fora da Itália em séculos, e foi decisivo na queda do comunismo no Leste Europeu, inclusive em seu país natal. A eleição de um Papa latinoamericano deverá ter impacto semelhante. Dependendo do país natal do Papa, se repetirá o mesmo que aconteceu na Polônia, cujos governantes locais viram seus esquemas de poder caírem com o passar do tempo, muito por influência do Papa conterrâneo. Aliás, a América Latina possuiu e possui, como outras regiões do mundo, vários governantes que não largam o cargo mesmo com incapacidade física para exercerem o cargo. O oposto do que Bento XVI prometeu fazer no próximo dia 28.

Tudo isso são apenas hipóteses para a sucessão papal. Hipóteses que levam em conta aspectos espirituais, aspectos de gestão e aspectos geopolíticos. O Papa é líder de um credo com mais de 1,1 bilhão de seguidores declarados (alguns só declarados, sem o serem de fato ou sem praticarem) e é também chefe de um minúsculo Estado independente que lhe serve basicamente para formular pronunciamentos, documentos, normas eclesiásticas e leis canônicas sem prestar contas a nenhuma autoridade secular. Um Papa só pode ser grande se não ignorar os aspectos espirituais, nem os de gestão nem os geopolíticos.

Texto publicado originalmente no Blogue do Delfino.

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